domingo, 29 de março de 2020

Sou aldeão de gema

Sou aldeão de gema
Sou, visceralmente, um aldeão. Serrano.
Corre terra telúrica no meu sangue vivo.
Arfo a sol e monte.
Urzes e giestas são minhas flores adoradas.
Mato a sede com água pura.
Sua fonte é o ventre da terra sã.
Junto pedras às minhas pedras e construo meu abrigo.
O fogo é meu companheiro.
Minha lareira é um altar sagrado.
Vou às pinhas.
E ao cisco morto.
Odeio o fumo.
Como caldo.
São da minha horta as couves verdes.
Minha almotolia me alumia, inverno dentro.
Curto, em segredo, as azeitonas no meu odre, atrás da porta.
Dão para o ano inteiro.
Cozo pão de milho.
Mato o bicho com aguardente pura.
Como o alambique a faz.
Sou rijo como o granito,
Ao sol e vento.
Esconjuro o mal com a cruz de Cristo…
Mafra, 29 de Março de 2020
13h50m
Jlmg

domingo, 22 de março de 2020

Terraços ao sol


Terraços de sol

Me exponho ao sol como as sementes na eira.
Quero ser fecundado pela luz.
Dissipar sombras que me obscurecem.
Trazer à luz do dia minhas zonas mais ocultas.
Aquecer meu peito com a energia meteórica dos espaços siderais.
Entoar hinos e louvores à criação.
Sonhar com um futuro de paz e de harmonia para este mundo tão conturbado.
Gritar aos quatro cantos do universo que a felicidade é possível se houver paz nas consciências.
Se a solidariedade se tornar a lei universal no comportamento da humanidade.

Ouvindo RACHMANINOFF-RHAPSODY

Mafra, 22 de Março de 2020
6h56m
Jlmg

sábado, 21 de março de 2020

Anda poesia no ar


Anda poesia no ar

Anda poesia no ar no raiar da Primavera.
As aves andam em bando, alegres, cantam hinos de louvor.
Os ramos se cobrem de botões que, em breve, serão flores.
Até o sol se vestiu de luz e inundou a terra de fertilidade.
Ficou à espera pelos frutos que hão-de vir.
Quedadas lá nas alturas, as nuvens adormeceram da caminhada.
Enquanto o Verão que ainda vem longe, vai enchendo as suas fornalhas para a dura tarefa das vindimas e sementeiras.
Oxalá não venha outra invasão de vírus
Que nos ponha a cabeça em água…

Ouvindo  Gabriel Faure's Requiem Op. 48 Complete (Best Recording)

Mafra, 21 de Março de 2020
18h16m
Jlmg

sexta-feira, 13 de março de 2020

De cangalhas


De cangalhas

Bastou uma pequena lufada de bichinhos minúsculos.
Parece um tornado.
A terra tremeu.
Pobres e ricos.
Fortes e fracos,
Defendem a vida,
Com unhas e dentes,
Se agarram ao chão.

Cerraram as escolas.
Hospitais e clínicas,
Num gesto humano,
Dão-se as mãos.
Vêem-se aflitos,
Sem mãos a medir.

O dinheiro nos bancos
Fica gelado,
Não tem quem o trate.

Os figurões do dinheiro,
Com medo da morte,
Gemendo aflitos,
Tudo açambarcam.

Só os que dormem na rua,
Habituados a tudo,
Ao frio e à chuva,
Continuam alheios
Ao vírus da morte,
Como se estivessem em casa.

Mafra, 13 de Março de 2020
16h52m
Jlmg