Tinha acabado de escutar uma senhora
Que ainda usa o véu, cumpre todos os preceitos
E sabe todas as orações,
Mas que não conhece a verdade
Do amor de Deus.
Segundo ela, o amor de Deus existe
Para se sentir, e não para que seja
Distribuído por quem não merece.
O amor de Deus que eu conheço não é assim.
E por mais que lhe explicasse que
Jesus perdoou, inclusive,
Aos que o mataram, ela não quis saber.
O senhor padre não percebe nada.
Eles maltrataram-me.
Perguntava-lhe sobre ela e ela respondia
Sobre os outros.
Perguntava-lhe se no coração já os tinha
Perdoado e respondia-me que eles
Não eram bons.
Perguntava-lhe se conseguia ter o coração
Disponível para eles e insistia que eles
Não eram bons.
Informava-a que não precisava de confiar
E ela dizia cruz credo.
Mas que precisava de perdoar para
Se sentir bem consigo própria e repetia-me
Que ele é que não estavam bem.
Tentava encontrar algo de bem nela que
Sobressaísse e a fizesse repensar a vida e ela
Persistia falando mal dos outros.
Afirmei que o mal dos outros não devia fazer
Espelho em nós,
Mas ela repetia o palavreado.
Ensinava-lhe que era mais fácil amar
Quem nos ama, mas que o cristão também ama
Quem nos magoa e ela virava a cara.
Eu acrescentava e ela repetia.
Acrescentava e ela repetia, até esbracejar por
Não me ouvir dizer o que desejava ouvir.
E cansei. Cansei por ver nesta interminável
Conversa um coração cristão confundido.
Cansei por rever nesta conversa milhares
De corações cristãos confundidos. O senhor padre não sabe nada.
Por isso quem entrasse
Nos meus pensamentos,
Ouvia-me berrar.
Um grito mudo, seco, que me fez cerrar
Os punhos por debaixo das mangas antes
De iniciar a eucaristia.
Porquê, meu Deus?!
Porque é que as pessoas te confundem
Com as suas superstições?!
Porque é que se dizem cristãos como
Forma de sossegar a consciência?!
Porque não entendem a tua beleza?!
Porque não te entendem?!
Porque não amam como tu amas?!
Porque não sabem perdoar?!
Porque apontam o dedo umas às outras,
Esquecendo os seus próprios erros?!
Porque é que juntam as mãos para rezar,
mas não as juntam para amar?!
Porque é que estendem a mão para receber,
Mas não a abrem para dar?!
Porque é que a nossa forma de nos
Afirmarmos cristãos não nos faz melhores?
O que realmente queremos?
Nos dias de hoje, visivelmente marcados
Pelo desenvolvimento económico
e tecnológico, o sucesso pessoal
É dirigido basicamente a conquistas
Materiais.
Somos valorizados pela competência
Em obter dinheiro, poder e status.
Vivemos um quotidiano doente,
Onde pressão e ansiedade são
Nossos imperadores.
Mas por que tanta pressa?
Estamos numa era de mudanças rápidas,
Assim espera-se que tenhamos agilidade
Suficiente para vencer obstáculos,
Ganhar dinheiro,
Construir uma vida estável
- Nada mal para um final de milénio
Tão conturbado.
Realmente, precisamos nos adaptar
Aos novos tempos.
Mas simplesmente se adaptar não basta.
Precisamos, antes disto,
Criar um mundo melhor,
Gerar referências mais positivas
Para se viver. Senão iremos
Continuamente nos adaptar a padrões
Superficiais e sem sentido.
Não quero dizer que ganhar dinheiro
Seja um mero detalhe.
Ele é um instrumento da vida moderna
Necessário à sobrevivência e à realização
De alguns de nossos sonhos mais concretos.
Só não devemos confundir as coisas,
Relevando o dinheiro,
Ao invés de instrumento,
Como único objectivo.
Reconhecer e valorizar também o que
Preenche nossos corações é essencial
Para atingir equilíbrio e paz de espírito.
Parece que as pessoas se esqueceram
Ou não querem enxergar aquilo que elas
Mais desejam: amor, contacto, intimidade.
Fomos enganados por padrões sociais que só
Valorizam o externo em detrimento do afecto
Das relações verdadeiramente humanas.
É calor, o contacto entre as pessoas que
Move e preenche nossas vidas.
O ser humano precisa ser reconhecido
e acreditado pelos outros.
Ele precisa amar e ser amado; ser tocado,
Valorizado, compartilhar suas emoções
e ser sinceramente aceito.
É maravilhoso ter espaço para se
Expressar sem medo, é encantador poder
Ser a gente mesmo.
É claro que o crescimento pessoal depende
Basicamente do nosso próprio esforço,
Mas o incentivo de quem nos ama
E acredita em nossos mais íntimos potenciais
Actua como um vigoroso catalisador.
Compartilhar dá asas à criatividade e
Desenvolve em muito nossa afectividade.
Acolher o indivíduo como ele é não é fácil,
Não fomos treinados para isto.
O mundo moderno não nos prepara
Para exprimir afeição e carinho.
Ora, aceitar o próximo não é simplesmente
Respeitar seu espaço e suas características
Pessoais.
É, acima de tudo, reconhecer sua
Natureza única e particular,
Suas reais intenções, a luta íntima que
o sujeito trava consigo mesmo tentando
Cada dia mais melhorar.
Muitas vezes não temos paciência para
Lidar com as dificuldades dos outros.
Exigimos perfeição em troca da
Nossa atenção.
Vai ver o segredo é lidar com os outros,
E não com as dificuldades.
Como disse Carlos Molina,
Terapeuta sistémico, devemos conhecer
As pessoas como são, sem os problemas.
É claro que não podemos ser suas cridas,
Alimentando carências e inseguranças,
Ou concordando com tudo que dizem.
Mas podemos ser seus amigos.
Podemos nos tornar disponíveis,
Oferecendo aquilo que às vezes tanto
Cobramos - amor.
E assim poderemos ser realmente fortes
Para trilhar nosso rumo.
O verdadeiro poder surge da harmonia
Dos sentimentos.
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3 comentários:
"Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus"!
Perseguição à Igreja Católica no Vietname:
http://www.zenit.org/article-18806?l=portuguese
Exemplo de Fé e Coragem.
Naty,
em primeiro lugar peço desculpa pela intromissão... mas acho que deveria fazer referência ao "Confessionário dum Padre" de onde parte do texto foi retirado, destacando, como é óbvio, essa parte.
Fora isso, é sempre bom reflectirmos estes assuntos.
Beijo
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